Aqui você encontra a arte de contar histórias (storytelling) entrelaçada à empatia, mediação de leitura, educação, brincar, sustentabilidade e cultura de paz.
“Sabe o que eu mais sinto falta? Ser despreocupada.”
Esta frase de Katie A., diagnosticada com câncer em
2011, inspirou o projeto “If only for a second” (Se por apenas um segundo). Em
17 de junho de 2013, a Mimi Foundation
em colaboração com a agência Leo Burnett da França convidam 20 pacientes com
câncer a participar de uma experiência única de transformação visual.
Os participantes pensam estar recebendo uma mudança
de visual comum e são instruídos a fechar os olhos durante o processo. Porém,
quando abrem os olhos dão de cara com um “eu” extravagante! Nenhum deles consegue
conter a emoção e o riso. Nem quem assiste a estas verdadeiras transformações.
Conto da tradição oral irlandesa recontado por Fabio Lisboa
Este conto relata o encontro de dois personagens
irlandeses históricos que viveram no início do século XIX, um deles, um homem muito
simples e injustiçado; o outro, um letrado advogado; incansável buscador de
justiça.
Wilson
Paddy Wood era um lenhador humilde e honesto que morava num pântano mas
visitava quase todo santo dia a cidade vendendo um pouco de lenha a um preço
justo e comprando o que comer e vestir. Mesmo vestindo roupas fora de moda e
largas - que, aliás, combinavam com sua espessa barba, cabelo desgrenhado e com
seu peludo jumento - era bem visto pela maioria, que se encantava com sua
simplicidade e bom coração. Wilson dizia assim:
- O que é justo é justo: Madeira! Madeira! Pague o quanto puder! Se não
puder, pague quanto puder - e quando puder!
Reconto de
lenda histórica japonesa porFabio
Lisboa
Nos tempos medievais no Japão existiu um
talentoso artista, Mochimitsu, que encantava a todos quando tocava o seu
hichiriki. O músico viajava muito pois sua arte era requisitada pelos clãs dos
quatro cantos do país.
Diziam que quando viajava pelos mares, até as
baleias e aproximavam para ouvir melhor a arte de Mochimitsu. Acontece que
quando estava em Aki prestes a partir rumo à província de Tosa o navio em que
estava foi saqueado por piratas sanguinários. E a embarcação não contava com
nenhum samurai para defender os tripulantes.
Reserve uma data (de 11 a 13 de
dezembro) para participar da Feira do Livro USP 2013- XV Festa do Livro da USP e ampliar o
seu repertório para contar histórias e garantir boas leituras para as férias!
Livros com desconto mínimo de 50%.
Editoras:
Excelentes participantes como editoras universitárias, Brinque-Book, WMF Martins
Fontes, Cosac Naify, Peirópolis, entre dezenas de outras editoras.
Local:
Escola Politécnica da USP - Campus USP Butantã – São Paulo – SP -Av. Prof. Luciano
Gualberto, Travessa 3, nº 380, CEP - 05508-010.
Data: 11 a 13 de dezembro. Horário: das 09 às 21 horas.
Começamos com o silogismo (comumente atribuído a
Mario Quintana) para responder poeticamente à afirmação proposta pela campanha
do Itaú que dá milhares de livros infantis grátis à quem se cadastra no
site da Fundação Itaú. Mas é possível responder ao titulo deste artigo de
muitas formas. Ler para uma criança: afinal, isso pode mudar o mundo mesmo?
Para começar, ao ler um livro mudamos temporariamente de mundo, ao adentrar o
mundo da ficção, criamos, em parceria com o autor, um mundo diferente do nosso.
1.O ouvinte tem o direito de ouvir histórias. Infinitamente, ouvir
histórias.
2.O ouvinte tem o direito de ouvir as histórias que bem entender.
Infinitas histórias provindas de inúmeras tradições, culturas, regiões e eras.
3.O ouvinte tem o direito de entender o que bem entender das histórias que
ouvir.
4.O ouvinte tem o direito de não querer ouvir história alguma.
5.O ouvinte tem o direito de, quando quiser ouvir histórias, ouvi-las num
lugar confortável, tranquilo e silencioso.
De ação:
6.O ouvinte tem o direito de falar.
7.O ouvinte tem o direito de falar apenas em pensamento se quiser.
8.O ouvinte tem o direito de rir ou chorar, se sentar ou se deitar,
levantar, pular ou cantar no meio da história.
9.O ouvinte tem o direito de dormir no meio da história.
10.O ouvinte tem o direito de expressar sentimentos, entendimentos ou
dúvidas, com ou sem palavras, antes, durante e depois de ouvir uma história.
De imaginação:
11.O ouvinte tem o direito de imaginar.
12.O ouvinte tem o direito de imaginar o fim da história antes da história
chegar ao fim.
13.O ouvinte tem o direito de imaginar outro fim para a história depois que
esta chega ao fim.
14.O ouvinte tem o direito de pedir, infinitamente, que lhe contem novas
histórias.
15.O ouvinte tem o direito de pedir, infinitamente, que lhe contem a mesma
história.
E o dever e desafio do contador de histórias é
respeitar e atender a todos estes direitos do ouvinte, sem perder (e sem deixar
o ouvinte perder) o fio da meada de cada história que conta.
O verbo ler não suporta o imperativo. Aversão que
partilha com alguns outros: o verbo “amar”... o verbo “sonhar”... bem, é sempre
possível tentar, é claro. Vamos lá: “Me ame!” “Sonhe!” “Leia!” “Leia logo, que
diabo, eu estou mandando você ler!”
Meu
avô Luiz, quando jovem, morava na Rua Sergipe, bem em frente ao Cemitério da Consolação.
Muitas
vezes, ao voltar para casa, fugindo da agitação paulistana de carros subindo e
descendo a Rua da Consolação que já nos anos 30 do século passado parecia barulhenta,
meu avô cortava caminho pela calmaria do meio do cemitério.
Às
vezes era fim de tarde, à noite caia em meio à passagem pela necrópole. Muitas
de suas histórias se passavam nesta passagem entre o mundo dos vivos e o dos
mortos e vice-versa.
Seria
impossível dizer quais histórias aconteceram de fato, quais eram provindas da
tradição oral ou quais eram inventadas na hora por ele na hora porque ao
recontar, parecia reviver todas as suas aventuras, verdadeiras ou fictícias e, com precisão, graça, dava
vida até ao que talvez... não tivesse mais vida.
Chegando ao templo, o professor
universitário queria logo pesquisar e aprender tudo sobre o Zen. Com certa
impaciência, esperou o mestre que foi chegando a seu tempo.
- Gostaria de aprender o
Zen - disse o professor ao mestre, enquanto começava a discorrer sobre seus
conhecimentos e questionamentos filosóficos à respeito do zen.
- Primeiro, gostaria de lhe servir chá - disse
o mestre.
Era
fim de tarde e o avô passeava com o neto por uma das movimentadas praças da
barulhenta cidade em que viviam.
Havia
o barulho de pessoas, celulares, carros, ônibus, buzinas, sirenes, construções.
-
Está ouvindo as cigarras cantando?
-
Não, vô.
-
Chegue mais perto, elas estão ali.
-
Eu nunca vi uma cigarra por aqui! Será que elas ainda existem na cidade, Vô?
O avô se abaixou próximo ao banco da praça.
-
As cigarras se mimetizam, se disfarçam na folhagem e é difícil ver as
danadinhas mas sei que estão por perto. Ainda moram por aqui, sim! Se formos de
encontro ao som que emitem, talvez possamos ver a vibração de suas membranas,
que é como cantam.
O
neto se abaixou e conseguiu enfim ouvir a cigarra. Esta, com medo, parou de
“cantar”. Mas os três continuaram lá, se observando, e quando a cigarra
percebeu que o avô e neto não lhe representavam perigo, recomeçou a melódica.
Os dois conseguiram vê-la e ouvi-la direitinho desta vez.
-
Vô, como você consegue ouvir tão bem?
- Na verdade, eu não ouço mais tão bem, mas aprendi a prestar atenção ao que vale a pena ser
escutado.
E
naquele momento a criança e o velho ouviam muito bem a natureza da cidade.
-
Veja que muitos passam e poucos escutam o som das cigarras. Agora veja o que
acontece, se alguém irá ouvir este som baixíssimo...
O
avô tira do bolso e deixa cair delicadamente uma moeda na calçada.
Na
mesma hora, mesmo com a poluição sonora ao redor, várias pessoas olham para o
chão bem na direção do dinheiro.
-
Viu, não se trata de ouvir, mas de saber ouvir. Saber o que ouvir e escutar
melhor.
a partir da versão de Rona Leventhal, The Cricket
Story
Referências
Livro: Spinning Tales, Weaving Hope: Stories,
storytelling, and activities for peace, justice and the environment, 2002, New
Society Publishers, Canada, p. 201.
Um dia o esperto João Grilo marcou, em sua casa, um
encontro com um homem dito sábio. Mas esqueceu-se de um detalhe que era, na
hora marcada, estar em casa.
Chegando lá, o tal sábio bateu na porta entusiasmado
em estar cara-a-cara com João Grilo, o cabra mais astuto da região.
E...
Nada de João.
O sábio esperou, esperou, e foi ficando desapontado,
mas sabia que a sabedoria deveria andar lado-a-lado com a paciência.
Bateu na porta de novo, pronto para começar o
bate-papo ensinando bons modos ao espertalhão!
E...
Nada de João.
O sábio foi perdendo a paciência quando
percebeu que havia batido com a porta na cara, e bateu nela uma última vez com
força (não com a cara, mas com a mão)!
E...
Nada de João.
Quando perebeu que o cabra safado havia lhe deixado
na mão, o sábio perdeu de vez a paciência e com ela a sabedoria. Antes de
ir embora, achou no chão um pedaço de carvão e escreveu bem grande na porta de
João Grilo:
IMBECIL!
Enfim, voltou para a sua casa. Só que mal fechou a
porta, ouviu "toc, toc, toc"...
- Quem é?
- É João.
- Quer o quê?
- Pedir perdão.
A porta se abriu e João Grilo disse assim:
- Ora, o senhor que me perdoe o esquecimento, viu, é
que só me lembrei do nosso encontro quando vi o teu nome escrito na minha
porta.
Ouvi este conto da Contadora de história, Professora
de contos populares e Língua encantada Andrea Sousa.
João Grilo, como Pedro Malazartes, é personagem
comum da tradição oral e dos contos populares brasileiros. Segundo a
pesquisadora Evelin Guedes, ambos provém da tradição ibérica mas adaptaram-se à
cultura brasileira, tornado-se ainda mais astutos e malandros por aqui,
vencendo as adversidades e desafiando os mais fortes, cultos, ricos ou
poderosos com criatividade, bom humor e ironia. João Grilo ficou famoso na peça
teatral escrita por Ariano Suassuna em 1955, Auto da compadecida, adaptada para
o cinema e mini-série de TV.
Um quesito importante ao se narrar uma história é a atenção.
Se estivermos atentos ao que contamos, não deixaremos
o fio da meada se perder.
Imagine que os passes do time branco são os passos da
trama de algo que você está contando, algo cheio de idas e vindas, atrativos,
antagonistas e reviravoltas. Então não se enrole no fio da meada.
Concentração! Foco! Siga as instruções do vídeo e conte!
Boa sorte!
(para maximizar a imagem em sua tela clique no quadrado abaixo e à direita da tela de vídeo)
(para sair do modo tela cheia tecle ESC)
(caso o vídeo não esteja aparecendo clique no link abaixo)
(leia o trecho abaixo somente depois de fazer o teste)
Aprofundamento
Há ao menos três jeitos de aproveitarmos este teste como
metáforas para a nossa prática como narradores (e seres humanos) e pensarmos
juntos:
1.
Depois de ver o vídeo, podemos concluir que, ao contar
histórias, é preciso atenção não somente “aos passes” (como estamos entregando
aos ouvintes os passos da trama) mas também “ao que acontece ao redor” (como os
ouvintes estão recebendo as nossas palavras). Será que estes estão participando
e engajados no “jogo narrativo” ou estão, como ursos dançantes, “à parte”?
2. No final, a campanha surpreende ao pedir ao
espectador para que “Fique atento aos ciclistas”. Neste caso, estar atento ao
que não vemos num primeiro momento pode ser uma questão de proteção (ou
desrespeito) à vida. Cabe refletirmos o que mais não vemos ou fingimos que não
vemos ou deixamos pra trás no nosso “ponto cego” e que, tanto em nossas narrativas
quanto na convivência diária no mundo contemporâneo, seria importante olharmos
com cuidado e darmos mais atenção.
3.
Entender o poder de conduzir à atenção e surpreender com
o uso bem elaborado do foco narrativo.
O narrador dá ênfase a uma parte da história e encobre outra para que esta, quando
aparecer, surpreenda o espectador. Podemos constatar que uma narrativa bem
construída dá pistas aos ouvintes e coloca elementos que podem desvendar a
trama desde o começo (ou, ao menos, antes do fim).
A magia acontece quando descobrimos que todas (ou
quase todas) as peças do quebra-cabeças estavam lá, só não conseguíamos ver o
todo (big picture).
Continuidade
Estar atento ao fio da meada e ao que acontece ao
redor do espaço da narrativa, estar disposto a ver (e fazer ver) o invisível e estar
preparado para ser convincente, entender e surpreender o ouvinte fazem parte da
busca de vida de um contador de histórias.
É fascinante sentir o poder das técnicas citadas ao ser
arrebatado incontáveis vezes em narrativas que parecem não cansar nunca de ser
revisitadas, ao ler contos de fadas, contos populares, maravilhosos; ou ler livros
de Agatha Christie, Stephen King, Marcos Rey, Pedro Bandeira; ao ver filmes como
E.T., StarWars, Crash – No limite; ouvir
canções de Chico Buarque, Caetano, Gil, Beatles, Coldplay; ou ouvir experientes
contadores como Dan Yashinsky, David Novak, Regina Machado, Gislayne Matos e Antonio
Rocha, só para citar alguns.
Trechos destas obras e da fala destes narradores nos permitirão
penetrar com mais profundidade no entendimento do que nos capta a atenção, nos admira,
nos faz ver além e nos conduz nas viagens pelo mundo das narrativas... mas esta
já é uma outra jornada.
(por favor, comente caso deseje que algum dos temas
deste post seja aprofundado)
Era
uma vez um contador de histórias que não sabia como começar um conto. O seu
maior medo era lhe deixarem no meio da fala, falando sozinho. Terminar era
fácil, só por ponto final e pronto. Silêncio. Fim. E depois do fim, quem sabe
um pedido: “conta outra”. Conto, claro, mas como começar uma nova história? Como
começar sem que ninguém desista de ouvir antes do meio e arranje um meio de não
chegar até o fim?
Diego não conhecia o mar.
O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas
altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas
alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus
olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto fulgor, que o menino ficou mudo
de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo,
gaguejando, pediu ao pai:
- Me ajuda
a olhar!
Referências
Texto: "O Livro dos
Abraços" de Eduardo Galeano, Tradução de Eric Nepomuceno, ed.
L & PM.
À minha amiga contadora de histórias Rosita Flores - que me
ajudou a olhar, pela primeira vez, das areias da praia, para a poética de
Eduardo Galeano.
Ao meu aprendiz de contador de histórias de 8 anos, Gleisson
- que nunca viu o mar, e me pediu para ajudá-lo a realizar este sonho que, se
Deus quiser, será real em agosto de 2013.
"A paz
universal e duradoura poderá ser estabelecida apenas se baseada na justiça
social. Se você deseja a paz cultive a justiça".
Norman Borlaug - Agricultor, ganhador do Prêmio Nobel da Paz 1970.
“Queremos paz e
justiça e lutaremos por isso com garras e dentes.”
O
lema das montanhas estava para mudar. Os animais estavam cansados dos mandos e
desmandos dos leões-da-montanha. Alguns deles caçavam mais do que precisavam
para comer. Estes poucos felídeos abusavam de seu poder, rompiam com a lei
universal dos ciclos da natureza e com isso geravam desequilíbrio e
insatisfação geral. Com isso, criaram uma má fama para a sua espécie e o seu
modo de agir e ninguém queria mais saber daquela ditadura felina predatória e insustentável!
Porém,
apesar da insatisfação, não havia um bicho que levantasse a voz para o modo de
vida que viviam e que acabava com a vida nas montanhas. Até que um dia as
cabras criaram coragem e baliram alto: