Aqui você encontra a arte de contar histórias (storytelling)
entrelaçada à empatia, mediação de leitura, educação, brincar, sustentabilidade e cultura de paz.

Fábula Africana: A Tartaruga e o Leopardo


Reconto da tradição oral por Fabio Lisboa

Um dia, na savana, o Leopardo, de tocaia, surpreendeu a Tartaruga. Apareceu com suas garras e dentes bem na frente da pobre e num segundo, poderia devorá-la.

- Não me mate ainda, não tenho escapatória, mas ó, grandioso e piedoso, Leopardo, conceda-me um último pedido.

- Uh, desde que não vá longe. E nem se demore. Estou com fome! Qual o seu derradeiro pedido, Tartaruga, antes que eu te devore?

- Deixe-me andar até ali e espalhar a terra.

- Está bem.

A Tartaruga deu dois passos, esfregou as patas para todo lado, depois rolou de um lado pro outro e, tanto quanto possível, saltou e caiu pesadamente no solo. Foi então de volta às garras do felino - que já estava com a boca salivante. Bem de perto, a Tartaruga orgulhosamente declarou:

- Pronto, príncipe das savanas, pode me comer.

- O prazer é todo meu, Tartaruga. Mas antes, me conte, por que este pedido tão estranho? O que fez ali?

- Quando meus filhotes verem o meu cadáver morto no chão, próximos a estas marcas, eles e os outros animais da savana saberão que a Tartaruga não se rendeu facilmente. Se lembrarão de que o menor enfrentou o maior e que, talvez um dia, uma Tartaruga possa sobreviver ao ataque de Leopardo. A minha história será lembrada e isto dará aos pequenos esperança.

Quando a pequena quelônio terminou sua fala, o grande felino não estava mais salivante e sim com os olhos úmidos. O famigerado impiedoso perdeu a fome e seu coração de Leopardo se alimentou de compaixão. Poupou a corajosa Tartaruga que o enfrentou, não com garras e dentes, mas com as bonitas palavras que saíram de sua boca.

E assim, não só a Tartaruga mas a sua história sobreviveu.

Reconto de Fábula da África por Fabio Lisboa
Referências
Livros:
Chinua Achebe – Anthills of Savannah.
Dan Yashinsky – Suddenly they heard footsteps: Storytelling for the 21st century –University Press of Mississipi, 2006.
Imagem:
"Psammobates geometricus", espécie de tartaruga de água doce, encontrada na África do Sul, ameaçada de extinção.

Sessão de Contos:
Histórias Africanas: Justiça na Savana
O contador de histórias Fabio Lisboa reconta narrativas selecionadas por Nelson Mandela (Meus Contos Preferidos), Hugh Lupton (Histórias de Sabedoria e Encantamento) e Rogério Andrade Barbosa (Três Contos Africanos de Adivinhação). As histórias escolhidas tratam de traição, justiça e redenção.

No 10º Festival A Arte de Contar Histórias nas bibliotecas públicas de São Paulo, consulte a agenda do blog sobre os locais, de 11 a 19 de outubro de 2014.

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Rubem Alves – Empatia: É assim que acontece a bondade



Por Fabio Lisboa

A experiência da leitura de Rubem Alves pode nos despertar para experiências cotidianas tanto menos indiferentes, desérticas, embotadas e solitárias, quanto mais enriquecedoras, cheias de vida, emotivas e solidárias. O autor nos convida a olhar o mundo com os olhos do outro. A sermos mais empáticos. Menos frios. A enxergar a história do outro, mesmo que seja triste.

Se o contador de histórias é a história que conta, e o outro também se conta (e se encontra) aí nesta mesma narrativa, podemos ser então, ao narrar, ao mesmo tempo, nós e o outro. E assim, neste espaço comum, com nossas emoções compartilhadas e nossa capacidade de buscar finais felizes, talvez possamos tornar a nossa história – e a do outro - menos triste.

Vistas por este prisma, narrativas podem mesmo iluminar quem está na escuridão? Podem ensinar algo a quem não quer nem saber? Acredito, como Rubem Alves, que as palavras podem, sim, ser capazes de alegrar e trazer a primavera até para as areias e gelo... E quando isso acontece...

É assim que acontece a bondade
Por Rubem Alves

Contador de Histórias/Autor no Programa Universo Literário




Pareceu-me um bate-papo sobre a vida e os contos, um conta-causos no alpendre da casa, regado à leite quente e pão-de-queijo, mas foi uma entrevista ao vivo para a rádio UFMG Educativa, Programa Universo Literário, pela jornalista, bibliotecária e apresentadora (com seu simpático sotaque mineiro) Rosaly Senra.

Falamos sobre o meu livro “O Mistério Amarelo da Noite”, sobre literatura infantil, sobre os caminhos da criação literária e do contar histórias e, também, claro, contei histórias. Uma delas de terror, que ouvi muitas vezes meu avô contar, “Sozinho no Cemitério” e a outra, um trecho do livro.

A conversa durou 18 minutos e foi realizada no dia 21 de julho de 2014.

O programa de rádio da Universidade Federal de Minas Gerais idealizado pela Rosaly Senra pode ser ouvido pela internet neste link

Espero que ao ouvir, você também se lembre das conversas com os avós, dos contos - tão saborosos quanto pães-de-queijo - lidos pelos pais ao pé da cama, dos tempos de se imaginar as histórias - tão calorosas quanto chocolate quente - ouvidas nas ondas do rádio ou nos alpendres das casas.

Consegue se lembrar? Ou imaginar? Então, conduzidos por estas ondas de outrora chegamos, enfim, no agora, não?

É só clicar:

Fabio Lisboa
Referências

O Mistério Amarelo da Noite

Nelly Novaes Coelho comenta sobre o “O mistério amarelo da noite”

O Tradicional e o Novo ao Contar Histórias

Book Trailer





Rubem Alves: Homenagem à Amizade


Por Rubem Alves

Lembrei-me dele e senti saudades... Tanto tempo que a gente não se vê! Dei-me conta, com uma intensidade incomum, da coisa rara que é a amizade. E, no entanto, é a coisa mais alegre que a vida nos dá. A beleza da poesia, da música, da natureza, as delícias da boa comida e da bebida perdem o gosto e ficam meio tristes quando não temos um amigo com quem compartilhá-las. Acho mesmo que tudo o que fazemos na vida pode se resumir nisto: a busca de um amigo, uma luta contra a solidão...