Foto: Eduardo Hanazaki |
(continuação do post Contadores de Histórias:
Artistas Rupestres das Palavras)
Era
uma vez um humilde lavrador cujas terras sempre foram inférteis. Cansado de
plantar muito e colher “pouco ou quase nada” decidiu tentar a sorte pelo mundo.
Pediu
ao vizinho, lavrador ainda mais miserável que, no entanto, nunca desistia de
plantar em suas terras pedregosas:
-
Amigo, cuide dessa terras como se fossem suas.
O
vizinho agradeceu e retribuiu o gesto do outro de ceder suas terras dando em
troca o que ele tinha de melhor:
-
Amigo, leve o pouco que colhi para que não passe fome durante a viagem. Leve
também sementes para prosperar e que encontre terras férteis em seu caminho!
E
assim partiu o humilde lavrador e ficou o pobre lavrador cuidando daquelas
terras inférteis – que eram, ao menos, mais promissoras do que as suas antigas
terras pedregosas.
Bem,
se numa fina camada de terra em cima da rocha o pobre plantador conseguia
colher o pouco que fosse, quando pode arar terras mais profundas e plantar mais
sementes, o homem fincou ali os seus sonhos.
Semeando
grandes esperanças e fazendo-as germinar com muito trabalho, aos poucos, das
terras inférteis começaram a brotar riquezas naturais.
O
humilde viajante também levou com ele grandes esperanças. Mas demorou demais
para achar o local ideal, para agir e plantar as sementes que o vizinho lhe
dera, estas ressecaram-se no percurso e, ao serem enterradas no solo duro,
nunca mais tiveram forças para sair debaixo da terra.
Os
sonhos do lavrador ficaram também ali enterrados e, concluindo que o “pouco ou
quase nada” que tinha em suas terras inférteis era melhor do que nada, decidiu
voltar.
No
tempo em que este vinha voltando para as suas terras agora de posse do outro,
esse outro continuava prosperando. Quando, enfim, adentrou seu antigo pedacinho
de chão ficou abismado com a beleza verdejante ao pé do chão e com a fartura de
cores e frutas em contraste ao céu azul.
-
Amigo, fico feliz de ver como as minhas
terras prosperaram aos seus cuidados!
-
Amigo, que bom que voltou! Veio me fazer uma visita? Pois seja muito bem vindo
em minhas terras prósperas!
-
Pois eu vim pra ficar! Espere aí, você não está achando que eu te daria assim,
de mão beijada, todas estas terras férteis que me pertencem não é?
-
Pois o que você me deu foram terras inférteis e o meu trabalho foi o que as
transformou! Ficarei feliz de dividir um pedaço delas com você... mas saiba que
estas terras não são mais suas!
-
Ora, que abusado, eu é que vou pensar se quero dividir um pouco com você já que
estas terras são minhas!
-
MINHAS!
-
MINHAS TERRAS!
E
assim seguiu a discussão que foi parar nos ouvidos do mais antigo morador da
região. O ancião era um indígena cuja etnia havia povoado toda a área antes da
chegada do homem “civilizado”.
O
ancião foi levado até os vizinhos briguentos. Ouviu pacientemente a história de
cada um dos dois homens. Depois contou como as terras férteis de seu povo
sofreram com a destruição das matas do entorno, com o plantio de monoculturas
intensivas e com o envenenamento do solo e das águas e foram, aos poucos,
tornando-se inférteis.
Contou
dos homens que exauriram a terra e nunca deram nada em troca. Compartilhou o
segredo de como fazer para que da terra brotasse novamente grandes esperanças.
-
Obrigado por nos contar tudo isso, senhor, mas precisamos ouvir a sua decisão, afinal,
a quem pertence esta terra?
-
É, diga logo, a quem pertence a terra?
-
Vamos ouvir o que ela tem a dizer.
O
homem velho lentamente se ajoelhou, depois foi se curvando até encostar o seu
ouvido no chão. Ficou em silêncio como se a terra estivesse mesmo dizendo a
qual dos dois ela pertencia.
O
ancião levantou-se:
-
A terra disse que vocês dois
pertencem a ela.
(continuação do post Contadores de Histórias:
Artistas Rupestres das Palavras)
Referências
Foto:
Pomar
de Kin Kan por Eduardo
Hanazaki
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