Uma resposta aparentemente simples...
por Fabio Lisboa
A resposta simples seria: contar histórias serve para fazer a criança dormir, ora! Quando criança, ao ouvir o fatídico chamado “hora de dormir”, eu obedecia na hora pois adorava pular para a cama. Bem, o mais correto seria dizer que eu adorava pular na cama. Na vertical! E a alegria de se imaginar um atleta olímpico na “cama elástica” e desafiar os pais não tem hora.
Bem, acredito que a infância desafiadora e saltitante não tenha mudado muito nestas poucas dezenas de anos (talvez com exceção dos “duplo twist carpados em 3D” e outros saltos “kinécticos” que não existiam até então).
Mas os pais continuam tendo o poder de impedir que as camas desmontem antes da criança completar 6 anos. Uns impõe sua autoridade pela lei do mais forte, pelo corte de algum prazer sensorial como ficar sem sobremesa (ou TV) ou então pela recompensa. No quesito recompensas sensoriais, alguns pais oferecem chocolates e doces (infalíveis, claro, mas obviamente nada educativos nem tampouco saudáveis) como moeda de barganha. Todavia, este tipo de escambo é inegociável quando se tem uma mãe nutricionista, então, por mais que eu e meu irmão tentássemos, a mínima cota diária de doce raramente era ampliada - e nunca para impedir nossos saltos quase-mortais.
No entanto, a recompensa que minha mãe oferecia era insuperável. Tinha mil formas, mil sabores, em mil mundos diferentes com mil sóis brilhantes. Podia ser na forma simples de uma casinha no meio da floresta, um abrigo que acolhe meninos e meninas perdidos na mata. E essa casinha, podia ser muito mais doce do que uma barrinha de chocolate porque a casa inteira era feita de doces... afinal, podia ser a casa da bruxa de João e Maria!
Essa casa mágica, não só nos dava prazer de poder imaginar comer tudo o que não podíamos. A casa também nos dava um medinho gostoso. Uma vontade de saber se Mariazinha iria enfrentar a bruxa, se Joãozinho iria ser mais esperto do que a adulta poderosa e malvada!
Esta história nos dava a força para enfrentar o sentimento de abandono. E toda a criança já sentiu o que é ser abandonada, seja de verdade e por muito tempo, seja enquanto ela se perdeu momentaneamente dos pais num local público, seja quando chega a noite e os pais vão para o longínquo quarto vizinho. Então nós já havíamos nos sentido como João e Maria perdidos numa floresta escura. E queríamos (e precisávamos) ouvir novamente como eles sairiam da floresta, como venceriam a bruxa e como finalmente seriam felizes para...
“Se continuarem pulando na cama agora antes de dormir, não tem história hoje!”
Não dava para viver na bagunça do “agora antes de dormir” sem o conforto do “sempre” das histórias! Sendo filha de um grande contador de histórias que era meu avô, depois de nos fazer apaixonados pelo mundo das narrativas e pelo afetuoso contato humano que a narração em voz alta proporciona, minha mãe tinha plena consciência do poder persuasivo desta frase “se fizeram (tal, tal e tal bagunça) não tem história hoje”. Esta intimidação acabava com qualquer tipo de bagunça - e tal.
Ao término de tal frase, o estrado parava de ranger, o quarto de subir e descer, o colchão deixava de cumprir a função de pula-pula e enfim, a cama voltava a ser cama. Elástica, começava a ficar a nossa mente. Com a nossa imaginação pegando carona em camelos atravessando desertos, com crianças desbravando florestas e em foguetes indo para o espaço conseguíamos esticar pra longe o nosso olhar e ao mesmo tempo nos ver mais de perto. Ao enxergar quem éramos, a nos sentir parte de algo maior e maravilhoso, aos poucos, calmamente, dormíamos. Sim, contar histórias serve para fazer as crianças dormirem.
Mas o leitor atento já reparou que, a partir desta resposta pessoal um pouco mais elaborada, contar histórias serve, no mínimo, para ensinar mais quatro coisas:
(Esses quatro ensinamentos, já vividos por você, serão revelados aqui na próxima semana, na próxima postagem...) (inscreva-se para receber os posts semanais direto em seu e-mail - na barra ao lado e acima – para isso, digite o e-mail e a verificação anti-spam).
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